Claro que se pode dizer que Mossoró também tem coisas que não tinha
antes. Mas isso não é privilégio de Mossoró. Cidades de todos os
tamanhos e de todos os Estados e de todos os países estão recebendo
coisas novas a cada dia, mês e ano. Cabe, porém a cada cidade preservar o
que tem. Seu patrimônio histórico, cultural, econômico e simbólico.
Mossoró, cidade que tanto alardeia amar sua história, na prática não dá
muitas provas disso. No Facebook do meu filho Telêmaco Sandino,
encontrei algumas lembranças de coisas a que Mossoró dava muita
importância e perdeu sem levar em conta. Vejamos alguns casos: Mossoró
tinha cinemas. O PAX se transformou numa loja, o Caiçara virou um prédio
de vidro que tem a sua importância, mas não cumpre um papel cultural
como o velho Caiçara, que abrigava também a Rádio Difusora e cumpria.
Tinha o Cine Cid, que virou o Teatro Lauro Monte Filho, por uma luta
nossa, dos artistas quando Mossoró descobriu que não tinha teatro há
noventa anos... Particularmente, sofri como presidente da Fundação José
Augusto para recuperá-lo, mas virei sanduíche entre a burocracia e a
“burrocracia” mesmo quando em algum momento havia dinheiro para fazer a
reforma. A atual secretária de Cultura do Estado dizia que não o fiz por
não ter prestígio com a governadora Wilma de Faria, mas hoje ela é
cunhada da governadora, ambas são mossoroenses e deixaram o caos se
aprofundar a ponto de deixar aquele prédio histórico ser metamorfoseado
de pombeiro em puteiro, com direito a antro de viciados em droga e
álcool com perigosos resultados para as adjacências. Hoje é ponto de
prostituição e consumo de álcool e drogas. Mossoró tinha a Casa do Gelo,
de onde Lampião ficou atirando na Estação do Trem, hoje dita “Das
Artes”. Virou uma loja de produtos paraguaios. Mossoró tinha a casa do
jornalista Dorian Jorge Freire, com um acervo fantástico. Só a
biblioteca continha dez mil volumes da melhor literatura brasileira e
universal. Hoje, ela não existe mais. Se não me engano, aqui na
distância paulistana, foi transformada em estacionamento. Mossoró tinha o
Aceu... Ali, assisti Gonzaguinha cantando, vi a primeira noitada de
viola da minha vida e fiz o I Congresso Potiguar de Repentistas
Nordestinos, com os maiores repentistas do Brasil e Patativa do Assaré,
vi mais de uma edição do Movimento de Extensão Cultural e Artística
(MECA) e do Festival da Canção Popular (FECAP) e da Semana de Filosofia,
além de outros eventos da melhor qualidade. Não foi só Aceu que acabou.
Os eventos de altíssimo nível se escafederam com ele. O Aceu substituía
com dignidade o Clube Ipiranga. Hoje, está abandonado, pois se perdeu
nesta cidade o hábito de substituir o bom pelo melhor. Aqui as coisas
morrem. E pronto. Mossoró tinha a ACDP. Das grandes festas de Ivonete
Paula, onde fiz também um show de Bráulio Tavares, o Raio da Silibrina.
“Ainda Continua Depois da Ponte”, mas... Já era à margem da ACDP e do
Sujeito Mossoró tinha um rio... Ali n’O Sujeito se fazia até concursos
de saltos ornamentais nas águas cristalinas do rio Mossoró. Não se
falava em preservação do meio ambiente, mas também não se deixava o rio
morrer. Ele foi multiplicado por três para ter morte tripla. O rio
Mossoró virou um enorme esgoto a céu aberto. E não tem nem projeto para
despoluição. Continuemos nas Notas Curtas.
Ao lado do Palácio Rodolfo Fernandes, hoje é a Prefeitura, um Palácio dito da Resistência, por ter sido a trincheira principal contra o bando de Lampião, mas a cidade hoje não resiste à força dos “pequenos e grandes ladrões que vivem no meio dos homens de bem” dominando a vida mossoroense matando, uns e morrendo, outros como se a vida não valesse um fósforo riscado.
Faroeste caboclo
Mossoró tinha o Café do Povo, ponto de encontro de todos que vinha aqui... Há tempos fechado e em ruínas... Mossoró era terra de gente valente... Hoje é terra de ninguém, onde manda quem pode e obedece quem é abestado. De capital do Oeste, transformou-se em “Capital do Faroeste”.
Artistas
Mossoró teve Elizeu Ventania... Hoje, a família dele passa por necessidades e o frontispício da casa onde morou exibe frase de protesto, por não ter sido cumprida a promessa de reforma. Mossoró tem Valdemar dos Pássaros, que brilhou em programas televisivos nacionais, como Sílvio Santos, Fantástico, Faustão e outros, mas... teve as asas cortadas sem que ninguém se importasse quando o seu canto mavioso e múltiplo calasse. Vive perambulando pelas ruas, à procura de mãos caridosas. Mossoró tem grupos de teatro, que sobrevivem de incentivos privados e são mais valorizados fora do que aqui. Mossoró tem uma lei municipal de incentivo à cultura que não incentivou nada até agora por absoluta inoperância, pois imperam ainda as festas com bandas que chamam as mulheres de “raparigas” e metem a chibata preta na cultura verdadeira.
Economia
Não tem espaço que dê para falarmos de empresas comerciais e industriais que sumiram do mapa levando consigo os empregos, tampouco da moda de que fomos vítimas na última década do fecha-fecha de hospitais, sem falar dos CSUs, Cohab e inúmeras outras repartições que viraram pó.
Quimera
Quem sabe, essa eleição suplementar, linda, organizadíssima, oportuníssima, tão cheia de propostas maravilhosas, de um debate profícuo, produtivo e enriquecedor, venha trazer coisas novas que nossa vã filosofia não tem alcance para imaginar, que venham compensar as boas coisas velhas perdidas nas dobras do tempo.
* Do Blog Prosa e Verso - Crispiniano Neto
NOTA DO BLOG do PC: A este respeito, principalmente, o abandono do Teatro Lauro Monte filho, o Blog do PC lançou o alerta em postagem sob título "Teatro do Absurdo", à semana passada em que mostramos através de fotos a que ponto chegou aquela situação. Concordamos em todos os aspectos com o que Velho Crispa descreve o desdém com que a nossa cultura é tratada no presente momento onde encontras-se em condição inversamente proporcinal ao que a propaganda institucional nos quer passar.
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