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 Em 2018, a pauta era clara e direta: redução no preço do óleo diesel, criação de um marco regulatório para caminhoneiros e isenção de pedágio de eixos suspensos, entre outros itens que pressionavam o governo Michel Temer. Agora, a agenda se concentra no impeachment dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal, na defesa do voto impresso e do governo Bolsonaro e no barateamento do preço do combustível. Esse, o único item da agenda que afeta a categoria. Há três anos o movimento grevista parava o país entre os dias 18 de maio e 1º de junho, provocando crise de abastecimento e outros graves reflexos na economia.

Lideranças ligadas ao setor ouvidas pelo Congresso em Foco não veem qualquer semelhança entre a paralisação de 2018 e a ensaiada agora por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, frustrada em boa parte do país com a liberação de barreiras pela Polícia Rodoviária Federal e a não adesão da maioria dos transportes de carga.

“Os que estão à frente disso daí não são caminhoneiros. Ninguém sabe quem é esse Zé Trovão”, diz o presidente da Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam), José Araújo Silva, mais conhecido como China, em relação ao autodeclarado líder do movimento, Marcos Antonio Pereira Gomes. Zé Trovão, como é chamado, deve ser preso ainda nesta quinta-feira no México, onde se encontra foragido após ordem de prisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.

China diz que os mais de 50 caminhões atualmente estacionados em protesto na Esplanada dos Ministérios não são conduzidos por profissionais autônomos, mas por empregados do agronegócio, os verdadeiros patrocinadores do movimento, segundo ele.

Um dos líderes da greve de 2018 no Rio Grande do Sul, o deputado Nereu Crispim (PSL-RS) também considera que os caminhoneiros estão sendo usados como “bucha de canhão” por setores do agronegócio e por um “movimento criminoso e antidemocrático”. Para ele, a greve convocada por militantes bolsonaristas fracassou: “Foi movimento político e não movimento da categoria”.

“Esses que estão parando as estradas ou estão parados em Brasília não são caminhoneiros. Os caminhoneiros estão na estrada trabalhando. Entre os caminhoneiros tem gente de direita, centro e esquerda. A nossa pauta é apartidária: é preço de combustível, de frete e pedágio, ponto de parada e melhoria das estradas”, afirma Crispim, presidente da Frente Parlamentar Mista dos Caminhoneiros, formada por 272 deputados e 22 senadores.

Policiais rodoviários ouvidos na condição de anonimato pelo Congresso em Foco também estranharam o envolvimento de empresários nos protestos nas barreiras estaduais. “Os chamados se espalharam pelos grupos de Whatsapp. Tem muita gente ligada a associações comerciais e empresários dando suporte nas barreiras. Muitos caminhoneiros não querem participar do movimento”, diz um desses servidores.

Outro policial conta que, mesmo assim, o clima na Polícia Rodoviária Federal é de preocupação. “Há receio de a coisa sair do controle. Temos de garantir o direito de ir e vir das pessoas e a segurança de quem protesta e de quem não quer participar dos atos”, ressalta. “O movimento nasceu com foco bolsonarista. Mas, para fugir do controle, é daqui para ali. É que pegou fogo muito rápido”, acrescenta.

Um dos motivos da preocupação, segundo essa fonte, é a falta de liderança do movimento. Característica comum à categoria dos caminhoneiros, representada por dezenas de entidades. “A categoria vai acabar porque não se representa. Esses que estão lá nos protestos estão sendo usados”, avalia China. Em 2018, também não havia uma liderança nacional capitaneando a greve. Desta vez, porém, nem aqueles que tomaram a frente naquele ano endossaram as paralisações. Pelo contrário, Wallace Landim, o Chorão, e Wanderlei Alves, o Dedeco, criticaram o movimento.

Eleito deputado federal após se apresentar como porta-voz dos grevistas há três anos, André Janones (Avante-MG) criticou o discurso de Bolsonaro, que se aproveitou da greve passada para ganhar votos e não cumpriu compromissos com caminhoneiros. “Em 2018 fizemos a greve para derrubar o governo devido ao preço do combustível, hoje, a greve é para defender! Quem foi que mudou de lado?”

O próprio presidente Jair Bolsonaro irritou parte dos manifestantes ao pedir que liberassem as estradas, com receio de uma piora ainda mais acentuada na economia. O áudio gravado pelo presidente foi recebido como “fake news” por seus apoiadores. Foi preciso o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas Gomes, vir a público para atestar a veracidade das declarações. Bolsonaro foi chamado de “frouxo” por manifestantes nos grupos de Whatsapp.

Para o deputado Nereu Crispim, que diz votar com o governo quase sempre mas divergir da pauta antidemocrática do presidente da República, afirma que a sociedade pode ficar tranquila porque não haverá adesão dos caminhoneiros a aventuras golpistas.

“Essas pessoas estão dentro dos grupos de Whatsapp, mas nem caminhoneiros são. Em quatro anos como deputado, Sérgio Reis nunca subiu na tribuna para defender caminhoneiro. Tomou a frente criminosa para usar caminhoneiro em movimento antidemocrático. A frente parlamentar, em conjunto com entidades do setor, diz que não apoia esse movimento, iniciado para afrontar o Supremo Tribunal Federal e o Congresso. Esse Zé Trovão nunca foi caminhoneiro. Nunca tínhamos ouvido falar dele como líder”, destaca o deputado gaúcho.

A Polícia Rodoviária Federal afirmou ter liberado 33 pontos de bloqueio criados por caminhoneiros bolsonaristas nas vias de diferentes estados na quinta-feira (9). Em nota, a corporação disse, ainda, que a ação teve início durante a madrugada.

"A PRF encontra-se em todos os locais identificados e permanece trabalhando pela garantia do livre fluxo nas rodovias federais, viabilizando o escoamento da produção assim como o direito de ir e vir dos motoristas e usuários", diz a Polícia Rodoviária.

Para conter eventuais excessos e liberar estradas, a PRF dispõe de 11 mil policiais. Desses, 8 mil atuaram de maneira simultânea na greve de 2018, com apoio da Polícia Federal e das polícias militares. De acordo com a PRF, o movimento nas estradas não teve articulação de entidades setoriais ou de transporte rodoviário de cargas, mas ocorreu de forma heterogênea por alguns grupos. Às 11h desta quinta, a paralisação dos caminhoneiros atingia as rodovias de ao menos 14 estados brasileiros, conforme boletim da instituição. Os atos tiveram maior adesão no Sul e no Centro-Oeste do país, regiões nas quais Bolsonaro teve maior votação em 2018.

Congresso em Foco



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