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*Por Ney Lopes

O velho companheiro de jornalismo Anchieta Hélcias me enviou mensagem ao amanhecer deste sábado, 12, “acaba de falecer na madrugada o seu amigo Marco Maciel”. Tomei-me de profundo sentimento de dor.

Conheci Marco, desde quando ele foi da União dos Estudantes de Pernambuco.

Na mesma época (1964), fui candidato a presidência do Diretório Amaro Cavalcanti, na Faculdade de Direito de Natal.

Com chances de vitória, renunciei a disputa, em protesto pela deflagração da Revolução de 64, que aplicou medidas repressivas contra o meu então concorrente, Nei Leandro de Castro.

Marco foi um dos que me aconselharam a renunciar.

Em 1966, após ganhar um prêmio Esso de reportagem, com texto publicado em jornal potiguar (“A cidade de Natal por dentro“), resolvi atender o convite do jornalista Calazans Fernandes para trabalhar na elaboração de cadernos especiais sobre o Nordeste, elaborados pela “Folha”, na sucursal de Pernambuco.

Simultaneamente, frequentei a tradicional Faculdade de Direito do Recife.

Além da Folha integrei o quadro de repórteres do Jornal do Comércio, Diário de Pernambuco, sucursais do JB, revistas “O Cruzeiro” e Manchete, todos em Recife.

Convivi com os jornalistas Joezil Barros, Gaudêncio Torquato, Anchieta Helcias, Camelo, Clodomir Leite (fotografo laureado pela VEJA), Egídio Serpa, Teixeirinha, Esmaragdo Marroquim e Alexandrino Rocha.

No jornal Jornal do Commércio, o meu chefe de redação era Zezito Maciel, irmão de Marco, nessa época Secretário do Trabalho e Ação Social do governador Paulo Guerra.

Certa vez, Zezito pautou para que identificasse a residência de uma filha de Tobias Barreto, pernambucano, jurista, filosofo, membro da Academia Brasileira de Letras.

Ela vivia em extrema miséria, na periferia do Recife.

Como repórter, cumpri a missão.

Por conta dessa reportagem, dona Calíope, a filha de Tobias Barreto, ganhou uma casa, doada pelo governo de Pernambuco, por interferência de Marco Maciel.

Posteriormente, o texto da reportagem foi publicado pela Academia Pernambucana de Letras, por sugestão do acadêmico Marcos Vinicios Vilaça.

Honrou-me essa distinção.

Em 1975, elegi-me deputado federal pelo RN.

Em Brasília, por acaso, o meu vizinho de apartamento foi o deputado Marco Maciel.

A feliz coincidência fez com que aumentasse a minha admiração pelo longilíneo pernambucano, conhecido como “mapa do Chile”, por parecer fisicamente com os traços geográficos do país de Pablo Neruda.

Na longa convivência, nunca vi ninguém tão bem-intencionado, cristão, seguidor fiel da doutrina social da Igreja, vida limpa e honradez, desde a relação familiar, até as condutas públicas.

Representava na política, o Mestre da ponderação e da prudência.

A sua frase emblemática aconselha: “quem tem tempo não tem pressa. Nós temos tempo para discutir, é muito cedo para tratar do assunto”.

Quando da fundação do PFL, ingressei no partido levado por Marco Maciel.

Ele me indicou membro do primeiro diretório nacional.

Depois, desempenhei várias missões partidárias, em relatorias de temas como salário mínimo no país, medicamentos, quebra do monopólio do petróleo, contratos de risco, remédios genéricos, legalização de patentes, sigilo bancário, empresa nacional, reajuste da tabela do IR, previdência social e outros, além de vice-liderança (com períodos de exercício), presidente de várias Comissões, inclusive Constituição e Justiça e as Mistas, que aprovaram o Plano Real no Brasil e mudanças no MERCOSUL.

Presidi, o então Instituto Tancredo Neves, indicado por Marco Maciel e o senador Jorge Bornhausen, órgão superior de estudos políticos do PFL.

Representei o partido na presidência do Parlamento Latino Americano (PARLATINO), entidade internacional parlamentar, institucionalizada por tratados, em todos os países da América Latina e Caribe, hoje com sede no Panamá.

Em todas essas missões, nunca deixei de ouvir, aconselhar-me com Marco Maciel e sempre recebi o seu apoio leal.

No seu livro de memórias, FHC confessou que teve em Marco o vice dos sonhos, não criava problema e resolvia tudo o que era para ser resolvido.

Isso aconteceu num país, em que as brigas entre titulares e substitutos começaram na primeira eleição, após a Proclamação da República, na medição de forças entre Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto.

Marco Maciel foi vice por dois mandatos seguidos.

Se somados os dias, em que governou o país no período de FHC, ficou mais de um ano na Presidência.

Preferia trabalhar em seu gabinete, no subsolo do Palácio do Planalto.

Era uma forma de demonstrar que não queria fazer sombra ao chefe do Executivo.

Foi feliz o advogado e jornalista José Ângelo Castelo Branco, ao escrever a sua biografia e intitular o livro de “Marco Maciel — Um Artífice do Entendimento”.

Adversários acusam-no de ter servido a ditadura.

Porém não há evidencias de que tenha assumido comportamentos arbitrários, ou que tenha se locupletado.

Mesmo na ditadura, nunca deixou de ser democrata.

No governo de Pernambuco foi magnânimo e conviveu respeitosamente com todas correntes.

Jamais se envolveu em escândalo, ou menção duvidosa​.

Com extrema habilidade política e paciência montou com Aureliano Chaves (MG) a ruptura com a ditadura “sem nenhuma crise institucional”. Ao analisar a crise brasileira, antes de ser atingido pelo Alzheimer, repetia sempre que: “não há crise econômica. Há crise política e as soluções somente virão, após a aprovação da “reforma política, eleitoral e partidária”.

Discreto, repetia a necessidade do político prevenir-se contra os invejosos e os autoficientes. Maciel tinha amizade com todos os grupos.

Nunca conspirou contra as esquerdas. Tornou-se amigo pessoal de Oscar Niemeyer, comunista confesso e usava a veia do conciliador.

Quanto ao seu conterrâneo ex-presidente Lula, o comportamento de Marco Maciel com ele foi de respeito e não agressão.

A recíproca não foi verdadeira.

Em um comício no Recife, ao lado da candidata petista à Presidência da República, Dilma Rousseff, Lula foi grosseiro com Marco Maciel, sem nenhuma razão.

Classificou o parlamentar pernambucano de “senador desde o tempo do imperador”. Complementou dizendo: “Desde pequeno ouço um cidadão aí que já foi deputado, presidente, da Câmara, vice-presidente e nada fez por Pernambuco, nem pelo país”.

A agressividade de Lula ainda hoje incomoda e é relembrada pelos amigos e correligionários de Marco Maciel, que nada respondeu.

Sem dúvida, irreparável a perda do Brasil com a morte de Marco Maciel.

Será exemplo de dignidade e ética política.

Formou-se nas lutas políticas universitárias, que infelizmente o decreto da ditadura nº 62.024/67 reprimiu durante anos, através da “Comissão do General Meira Matos”.

Se tal não tivesse ocorrido, certamente o país não enfrentaria o deserto de lideranças de hoje e muitos estariam preenchendo a lacuna da falta de um conciliador, no estilo Marco Maciel, na atual política nacional.

Por ironia do destino, quem dedicou a vida pública ao diálogo, aberto e conciliador, morreu enclausurado na sua própria mente, prolongando o seu silêncio

Deus o receba na Eternidade, com as honras merecidas!

*Ney Lopes é jornalista, ex-deputado federal, professor de direito constitucional da UFRN e advogado.

*Artigo transcrito do Blog do Carlos Santos



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