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O juiz Mário Azevedo Jambo, da 2ª Vara Federal do Rio Grande do Norte, mandou o “Blog do BG” apagar três publicações que faziam críticas ao procurador da República Fernando Rocha. As matérias, que entraram no ar no dia 18 de julho e logo ganharam repercussão nas redes sociais, acusavam o membro do Ministério Público Federal de incoerência. A decisão se estende às redes sociais do editor do blog, Bruno Giovanni.

Vídeos obtidos pelo blog mostravam Fernando Rocha em uma academia de ginástica poucos dias depois de os estabelecimentos serem reabertos em Natal. O procurador foi criticado porque, antes de ser flagrado na academia, vinha defendendo a manutenção do fechamento das atividades econômicas na cidade como medida de prevenção do novo coronavírus.

Logo após a divulgação do vídeo e das matérias no “Blog do BG”, o grupo de trabalho do Ministério Público do qual Fernando Rocha fazia parte – para elaborar ações de enfrentamento da pandemia no Rio Grande do Norte – divulgou uma nota informando que o procurador pediu desculpas pelo comportamento “pessoal e isolado” e que ele deixaria o grupo por causa disso.

Na queixa apresentada à Justiça, Fernando Rocha acusou o blog de atacar a sua honra e pediu que as matérias fossem retiradas do ar e que o site fosse proibido de voltar a fazer publicações semelhantes. Apenas a primeira parte do pedido foi atendida pelo juiz. A segunda, na avaliação do magistrado, configuraria “censura prévia”, o que não é permitido pela Constituição.

“O teor de cada uma delas (publicações) parece transbordar do democrático e precioso direito constitucional à liberdade de expressão e de crítica ao trabalho e atuação do Procurador da República, ingressando no indesejado âmbito de agressões e ofensas pessoais”, escreveu o juiz.

Apesar de mandar o blog apagar as publicações, Mário Jambo argumentou que a medida decretada não era censura nem ataque ao princípio de liberdade de expressão. “Tais direitos, apesar de constarem no texto constitucional, não são absolutos, encontrando limites em outros direitos e garantias constitucionais, como o direito à dignidade, à privacidade, à intimidade, à honra e à imagem das pessoas”, afirmou.

Ainda segundo o magistrado, expressões e adjetivações usadas pelo blog para criticar Fernando Rocha – ligando a pessoa ao cargo público que ocupa – “apresentam, em tese, potencialidade lesiva suficiente para ofender a honra e a reputação do querelante (procurador)”.

Críticas à censura

Assim que foi publicada, a decisão do juiz federal gerou reações de jornalistas e de entidades, que classificaram a medida como “censura”. Em nota, o editor do “Blog do BG”, Bruno Giovanni, informou que as matérias foram retiradas do ar. Ele, porém, contestou a decisão e afirmou que, ao procurar a Justiça para que as publicações fossem apagadas, Fernando Rocha fez “ilações” e atentou contra a liberdade de expressão.

“O senhor procurador chega a cometer o exagero de afirmar que ‘sequer se sente seguro para sair de casa’ depois de situação supostamente criada por este comunicador. Acontece que a situação não foi criada por mim, mas pelo próprio procurador, que inclusive reconheceu a incoerência em frequentar a academia”, escreveu Bruno Giovanni, em artigo no seu blog, negando ainda qualquer perseguição a Fernando Rocha.

O Sindicato dos Jornalistas do Rio Grande do Norte (Sindjorn) se solidarizou com Bruno Giovanni e afirmou que, sem liberdade de expressão, “é impossível viver num estado democrático de direito”.

“E o pior, censura essa pedida por um membro do Ministério Público, entidade que, por vezes, é acusada de ‘noticiar’ e ‘agredir’ a honra de terceiros (…)”, escreveu o sindicato.

Jornalista profissional com mais de 50 anos de atuação, o professor aposentado de Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Cassiano Arruda Câmara disse que a decisão de Mário Jambo é “inaceitável”.

“A Constituição que não permite a censura prévia também não autoriza ninguém a censurar a posteriori nenhum meio de comunicação. Quem assim agir termina se igualando a quem, por ventura, cometeu um crime capitulado na lei de imprensa. Não existe cobertura legal para a prática da censura”, escreveu Cassiano, no blog “Território Livre”.

Diretor-presidente do Grupo Agora RN, o jornalista Alex Viana disse que a decisão representa um “retrocesso”.

“Sem negar o direito do procurador se defender de eventuais exageros da crítica, se fosse o caso, o que se tem é uma decisão judicial censurando uma opinião cujo direito é assegurado pela Constituição. A meu ver, está clara a censura, o que é abominável sob todos os aspectos possíveis. Talvez fosse o caso de o procurador pleitear um direito de resposta, e olhe lá se caberia, visto que no nosso país, até onde se sabe, é livre a manifestação do pensamento e a expressão de opinião. A censura é grave e representa um retrocesso, na medida em que vivemos numa democracia teoricamente plena”, afirma.

Diretor-executivo do jornal Tribuna do Norte, o jornalista Daniel Cabral também comentou: “Quando a imprensa é atacada, coloca-se mordaça contra quem põe à luz o abscôndito, inclusive a soberba”.

O jornalista Dinarte Assunção, editor do “Blog do Dina” e comentarista da 96 FM, pediu um pronunciamento do Ministério Público Federal. “A decisão (…) deve ser repudiada e nos empurra para uma pergunta que se impõe: o @MPF_PRRN concorda que sua imagem seja arrastada para essa trama? Precisa dizer se sim ou se não”, escreveu, pelo Twitter.

Advogado e jornalista, Gustavo Negreiros afirmou que a decisão é “a mais absurda da história do RN”. “A decisão (…) é (…) reflexo das piruetas jurídicas cometidas pelo STF. Podar a liberdade de expressão é rasgar a Constituição”, escreveu, em seu blog.

Agora RN



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